Partire è un pó morire, dice l’adagio, ma è meglio partire che morire.”

(Carrara, na peça teatral Merica, Merica)

domingo, 5 de junho de 2011

Socialistas lideram Greve na Tecelagem

O ano de 1904 teve início, em São Roque, com insatisfações dos operários italianos da fábrica de tecidos Enrico Dell’Acqua, cuja principal importância para a economia local era o fato de representarem a mão-de-obra qualificada para indústria de que o país não dispunha. Ao final do século 19, segundo afirma Franco Cenni, em Italianos no Brasil, “o brasileiro tradicional constituía a classe dirigente, era proprietário de terras, fazia política ou se dedicava tranquilamente ao comércio, olhando ainda com certa desconfiança para o grande surto industrial”.

Assim, poucos brasileiros e alguns espanhóis integravam a classe operária da época, formada predominantemente por imigrantes italianos, realidade que se repetia na fábrica de tecidos Enrico Dell’Acqua.

Tecelagem Enrico Dell'Acqua e Cia., depois chamada Brasital

UM MOTIVO

Em fevereiro de 1904, uma greve se esboçava na fábrica e o motivo era a multa de vários tecelões pelo examinador de peças, segundo nota publicada no jornal O Sãoroquense. A situação pioraria no final do ano, com conseqüências drásticas para a economia local.
Em agosto houve a diminuição da jornada de trabalho aos sábados, quando os operários passam a sair às 16:30 horas e não mais às 18:15 horas. O fato, notificado no jornal O Sãoroquense, mostra que os operários da tecelagem estavam em processo de reivindicação.

O industrial Enrico Dell’Acqua, nessa época, já viajara definitivamente para Milão e quem respondia administrativamente pela tecelagem de São Roque era José Weissohn, grande acionista da empresa. Sua intenção era transferir definitivamente a indústria de tecidos para Salto de Itu, onde as condições de geração de energia para o movimento dos teares eram mais propícias.

ORGANIZAÇÃO

Diante da situação, os operários decretaram greve. A paralisação dos teares da fábrica Enrico Dell’Acqua denota claramente uma organização e consciência político-social que não eram próprias dos brasileiros naquele momento, quando poucos trabalhavam na indústria e sequer havia um proletariado agrícola, pois os colonos eram simples instrumentos de produção, segregados em seu pequeno mundo.
O movimento operário no Brasil era ainda incipiente, havia alguma organização, mas não existiam elementos de base que o sustentassem com determinação. As rebeliões ocorriam por impulso e geralmente se degeneravam em violência.

Nesse cenário brasileiro chegam ao país diversas levas de imigrantes italianos que já haviam participado, em sua terra natal, do Partido Socialista Italiano.
Misturados aos anarquistas, cooperativistas e unidos aos poucos brasileiros e espanhóis que trabalhavam na indústria, passam a constituir o primeiro núcleo de proletários em busca de sua organização.
No mês de dezembro de 1904 a população são-roquense vivia um momento de tensão.

Teares da fábrica de tecidos Enrico Dell'Acqua e Cia.

Os operários da fábrica Dell’Acqua, então em greve desde o mês de novembro, foram acusados de adentrar o prédio da indústria armados. Eles negavam a acusação.
Na noite de 4 de dezembro, os fios do telégrafo são cortados na encruzilhada da estrada do Sorocamirim, torneiras públicas são quebradas, e placas com numeração das casas, inutilizadas. Os atos de vandalismo são atribuídos aos grevistas.

O jornal O Sãoroquense afirma que os operários reagiram à acusação: “por intermédio de seu presidente, protestaram por meio de boletins que foram espalhados”. Esses boletins eram redigidos por Otaviano Palhano, intelectual italiano que publicava poesias no jornal local.
O movimento, em franco crescimento, gera a reação da polícia. Na tarde de 5 de dezembro, chegam de trem a São Roque o Dr. Arthur Pinheiro e Prado, 2º delegado auxiliar, seu escrivão, Augusto Beltrand e, segundo o jornal, “uma força de 25 praças commandados por um tenente, afim de inquerir sobre factos que aqui se deram relativos a telegraphos, greve, etc”.
Nessa época, a segurança da cidade era feita por apenas quatro policiais.

NEGOCIAÇÃO

A Câmara Municipal interfere nas negociações dos operários com José Weissohn. O presidente Francisco Guilhermino de Campos propõe a nomeação de uma comissão para intermediar as conversações entre patrões e empregados da tecelagem. Essa comissão é integrada por Bento Antônio Pereira, juiz de paz e presidente do diretório político do PRP – Partido Republicano Paulista – o partido da situação na cidade, Antônio Domingos França e o professor Antônio Arnóbio, também membros do PRP.

Presidente da Câmara e demais vereadores assinam um ofício que é entregue por essa comissão no escritório da indústria em São Paulo. Apesar da interferência do Legislativo, Weissohn recusa-se a negociar com os operários e resolve levar para Salto o maquinário destinado à instalação de uma estamparia de tecidos em São Roque.

Pressionado por um ultimatum dos operários, o industrial decide fechar a fábrica por tempo indeterminado, pagando aos empregados um mês de salário adiantado. Afirmava que, na reabertura da tecelagem, poderia dispensar os operários que bem entendesse.

CONFERÊNCIA SOCIALISTA

As conseqüências da greve foram desastrosas para a cidade. Casas comerciais chegaram a fechar, profissionais liberais viviam à míngua, senhoras da igreja católica faziam campanhas para comprar alimentos para as famílias dos operários desempregados.

Segundo nota publicada no O Sãoroquense, a tecelagem Enrico Dell’Acqua só voltaria a abrir suas portas em junho de 1905.
Em meio às contendas geradas pela greve, o jornal O Sãoroquense noticia a realização de uma conferência, no Teatro São João, cujo tema era a própria greve. Conduzida pelo operário socialista Tonso, a conferência contou com a participação de Antônio Picarolo e Dª Lesina. E o theatro se achava repleto de pessoas de todas as classes sociaes.

Picarolo falou durante duas horas sobre socialismo e analisou cientifica e praticamente a posição dos operários da greve. Leu a decisão de Weissohn, publicada pela imprensa e comentou-a com os ouvintes.

RUÍNA versus JUSTIÇA

O socialista Picarolo afirmava ver a ruína de São Roque na atitude de Weissohn: “porque grande acionista da Sociedade Dell’Acqua, por seu interesse próprio tenta aos poucos, mudar a fabrica para o Salto: vai agora a secção de tinturaria, mais uns dias, alguns teares e assim, mansamente despojará esta cidade de um estabelecimento importante e que é uma das fontes de prosperidade desta terra”.
Durante sua fala, Picarolo era interrompido constantemente por salvas de palmas.

Perguntou aos operários presentes sobre a veracidade da afirmação de que teriam ido à fábrica de mão armada, o que foi unanimemente negado.

Picarolo, então, conclamou os operários à união, que haveriam de vencer a causa: “Nada de irreflexões e atos subversivos. A justiça estará do lado dos operários. Façam união firme com tenacidade que vencerão”, disse, concluindo.
Se a justiça acompanhou os operários da futura Brasital nos anos seguintes, é fato duvidoso.

A verdade é que a tecelagem só seria definitivamente transferida para Salto mais de 60 anos depois do incidente gerado pela greve que marcou a influência dos imigrantes italianos na organização da classe operária em São Roque.


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