Partire è un pó morire, dice l’adagio, ma è meglio partire che morire.”

(Carrara, na peça teatral Merica, Merica)

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

AS RAÍZES ROMANAS DO CARNAVAL

Família Bonini no Corso, Carnaval de São Roque, 1935, em frente ao hotel da família *.


Nas décadas de 1930 e 1940, o costume em São Roque, durante os dias de Carnaval, eram os bailes da Literária e do São Paulo Club, cuja rivalidade levava a brigas nas disputas dos concursos de melhor fantasia e melhor desfile de rua, dos chamados cordões. Mas, principalmente nos anos 1930, o que animava o Carnaval nas ruas da cidade era o desfile conhecido como Corso em que as famílias fantasiadas apareciam em carros alegóricos pelas ruas da cidade, cada uma se esmerando para vestir as mais belas fantasias. E as famílias de origem italiana integravam-se aos festejos tradicionais.

VIA DEL CORSO

O nome Corso com o qual foi batizado esse tipo de desfile carnavalesco, com carros alegóricos que, ao longo do tempo, passou a ser costume em várias localidades do mundo, assim como o Carnaval, teve suas origens na Roma antiga.
A primeira notícia sobre o carnaval romano data dos anos 1141 d.C. a 1143. Segundo a pesquisadora Maria Nazareth Ferreira, a festa carnavalesca dessa época, era realizada do Testaccio ao Monte dei Cocci, em Roma, onde aconteciam corridas, lutas com animais, jogos militares e muita violência. O carnaval era organizado a partir da atual Via del Corso, onde desfilavam suntuosos carros alegóricos. Daí o nome Corso.

SATURNALIA

Mas as raízes do Carnaval – depois exportado para o mundo todo – são mais remotas e remetem-se aos antigos rituais romanos. Têm suas origens nas Saturnalia, celebrações em homenagem a Saturno que aconteciam desde o século V a.C., já que o Templo de Saturno, era celebrado em Roma desde 497 A.C.
Um dos principais deuses venerados pelos romanos dessa época e divindade mais antiga da península, Saturno era tido como aquele que deu origem ao mundo, semelhante a Zeus na mitologia grega. Segundo a mitologia romana criada pelas fontes históricas, a região atualmente conhecida como Lazio, na Itália, onde mais tarde seria fundada Roma, era governada por Giano, divindade que acolheu Saturno, o qual chegara por mar, e difundiria as artes, a agricultura e o uso da moeda, indispensáveis para a civilização dos homens da antiguidade.
Ainda segundo a mitologia latina, foi com a chegada de Saturno, o deus maior, que os homens conquistaram a Idade do Ouro, vivendo em paz, tranqüilidade, sem guerras ou conflitos, pois não havia classes sociais.
Mas, como na mitologia os deuses desaparecem sem explicações, Saturno ocultou-se e, assim, os romanos passaram a celebrar as Saturnalia, nos templos romanos, como cerimônias sagradas para que esse deus retornasse e, com ele, a Idade do Ouro.

Relações Sociais e a Subversão

As Saturnalia eram festas que aconteciam, normalmente de 17 a 23 de dezembro, quando nem mesmo os órgãos ligados à justiça funcionavam. Os rituais dessas festas eram impregnados da experiência cotidiana dos antigos romanos e após a cerimônia sagrada, havia divertimentos, como danças, jogos de azar e tudo o que era rigorosamente proibido durante o restante do ano.
A subversão da ordem estabelecida e das relações sociais era uma das principais características dessas festividades: os senhores serviam os escravos que deles zombavam, homens livres tornavam-se aristocratas, relembrando os tempos da origem, quando não havia discriminação social.
Esse carnaval pré-cristão, na verdade, acompanhava com seus rituais a passagem do Ano Velho para o Ano Novo, era uma festa de confraternização.

CARNAVAL MODERNO

Mais tarde, quando se formou a fé cristã, como essas festividades estavam grandemente sedimentadas no cotidiano do povo, a Igreja acabou por assumi-las e incluí-las no calendário litúrgico, antecedendo a Quaresma, que passou a funcionar como tempo de penitência. A princípio, elas aconteciam a partir de 26 de dezembro e depois passaram a ocorrer de 6 a 17 de janeiro. Posteriormente, a Igreja mudou o Carnaval e a Quaresma para fevereiro para reforçar a idéia de purificação já presente na população romana desde tempos imemoriais. Fevereiro (februari) significa ação de purificar.
Os papas passaram as ser os organizadores oficiais do Carnaval e pode-se afirmar que, no século XIII, o Papa Paolo II, grande reformador dessas festividades, foi o fundador do Carnaval moderno, transformando-o num ato político. Já o Papa Inocêncio VII deu impulso aos jogos carnavalescos, Alessandro VI autorizou o uso de máscaras nas igrejas. Mas foi com Giulio II, já no século XIV, que o Carnaval assumiu condição artística: os carros alegóricos tinham seu design assinado por autores como Bramante, Michelangelo, Rafaello e Sangallo.
Eram festas com grande esplendor e a forte presença da aristocracia, autoridades civis, príncipes e rainhas, nas quais se cometiam muitos excessos em nome de se gozar das delícias das modernas Saturnalia. A partir dos séculos XVI e XVII, o Carnaval expande-se e ultrapassa os limites da península.

LIBERAR TENSÕES

Apesar de ter seu sentido diverso das antigas Saturnalia romanas, o Carnaval da atualidade, afastado de seu sentido religioso, mantém o mesmo mecanismo de inversão de algumas situações nesses quatro dias: os poderosos são postos na berlinda, através da sátira, e a festa funciona também como válvula de escape das tribulações do dia-a-dia e de todos os problemas acumulados durante o ano.

Assim, o Carnaval passa a ter a função de equilibrar as tensões sociais, por meio de momentos de grande liberação.

Fonte: FERREIRA, Maria Nazareth. As Festas Populares na Expansão do Turismo – a Experiência Italiana. São Paulo:Arte e Ciência Editora - ECA-USP, 2005.

*Foto fornecida pela família Bonini.


Este texto tem direitos autorais.
Proibida cópia e reprodução de textos e imagens em qualquer meio.




Um comentário:

  1. Bonito texto. É sempre bom poder fazer uma reflexão sobre as raízes das festas populares. Parabéns!

    ResponderExcluir